De repente fecho os olhos.
Tento perceber que vozes são aquelas lá ao fundo.
No escuro.
Velhos jogam cartas.
Há outro som.
Assustador.
Passa por cima de mim como se saltasse de casa em casa.
Na escuridão.
Olho gelada.
Vulto encapado de negro de cabelos longos pretos de noite.
Mãos ossadas e unhas compridas e escuras de roxidão.
Tenho medo.
Estatelaste-te em frente a mim.
Paralizada de pânico.
Olhas meus olhos e no fundo da minha alma e dói-me.
Desapareces.
Corro descalça.
Tropeço nas pedras soltas e no vestido velho que trago.
Sinto-te colado a mim e não te vejo.
Grito por ti.
Grito para ti.
Parei.
O meu amor pede-me que desenhe num papel quem me perseguiu.
Pega no esboço e sorri.
Diz-me: " Não tenhas medo...quem te assustou fui apenas eu..."
Há pessoas assim.
Que com a boca não falam.
Que com dois ouvidos não ouvem.
Que com os seus olhos não expressam.
Há pessoas assim.
Que nos calando, fazendo-nos calar, amamos.
Que as ouvindo...inexistimos.
Que sem nos olhar...nos anulam.
Sem perceber como ou porquê,
Pessoas com boca calam-se.
Com dois ouvidos ouvem por quatro.
Que com tantos sentidos esquecidos se perdem na nossa expressão ao olhá-los.
Ás vezes já nem sei quem sou.
Nem sei se sou.
Sequer se me apetece ser.
Sequer se querem que seja.
Ao amar pessoas assim,
Não sabemos se devemos viver por elas.
Sabemos que as amamos mas que nunca nos amarão.
Com o passar do tempo e o aprofundar do silêncio.
Já será tão tarde,
Sem apetecer falar nem com palavra para dizer.
Já estará tão longe a felicidade,
Que ambos olharemos para trás,
E sem ressentimentos perceberemos a perda de nós próprios,
E a falta um do outro.
Não, não nos perdemos no tempo,
Só achámos que ainda tinhamos tempo.
E assim nos esquecemos de ser felizes e puros.
Mas só eu acabarei de consciência tranquila.
Acabámos ambos por atingir a paz.
Acabámos ambos por perder qualquer coisa.
Acabámos ambos por seguir em frente.
Mas tu acabarás infeliz porque a ti próprio te condenaste.